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Tony Gandra, Cabeleireiro e Terapeuta

Tony Gandra, Cabeleireiro e Terapeuta

Texto de Paulo Urban, médico psiquiatra e Psicoterapeuta do Encantamento

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Ele não somente corta seu cabelo, mas mexe em sua cabeça! Isto porque a arte de Tony Gandra, cabeleireiro profissional desde 1968, vai muito além da criatividade estética com que ele prepara os cortes de cabelo e estilos personalizados (visagismo) em seus clientes, sejam homens ou mulheres.

Escritor dotado de sensibilidade e Terapeuta Holístico credenciado, seu trabalho terapêutico pode ser chamado de Bio-psico-energético; recebe sem dúvida forte influência de W. Reich, mas assume outros referenciais, como a Psicologia Analítica de Carl Jung. Tony faz yoga há pelo menos 4 décadas, pratica o hipnotismo e tem ainda sua orientação voltada à Psicologia Transpessoal, tendo sido aluno do Dr. Pierre Weill na época em que se fundava a primeira Universidade Holística do Brasil, a Fundação Cidade da Paz, em Brasília, nos idos dos anos 80. O cabeleireiro, cujo currículo traz várias viagens profissionais e a passeio à Europa, domina quatro idiomas além do português: espanhol, francês, italiano e inglês, o que muito lhe facilita o contato com clientes internacionais.

De fato, os que sentam para cortar o cabelo com Tony Gandra, logo percebem que não estão sendo atendidos por um cabeleireiro padrão. Já o disse Walt Whitman: “O que pode ser tão discreto e tão forte quanto um toque?”. Eis aí uma das especialidades de Gandra: ele ouve de poros abertos seus clientes, o que lhe permite bem avaliá-los não só em suas carências estéticas, mas, sobretudo, em suas necessidades emocionais. Mais do que escutar, Tony, que sempre se dedicou ao exercício da espiritualidade em sua busca pessoal, está habilmente treinado em “sentir” as pessoas e, por meio de uma abordagem sutil, mas efetiva, dá os devidos toques a quem estiver de coração aberto e quiser escutá-los. Razão de tantos serem aqueles os que se tornam clientes fiéis da intervenção terapeuticapilar deste originalíssimo psicoiffeur.

Meu primeiro encontro com Tony Gandra ocorreu inusitadamente por ocasião de um Ritual Andino de Equinócio de Primavera, conduzido por Carlos Prado, médico naturista de etnia quetchua, realizado numa extensa área verde preservada numa chácara onde funciona a Escola Mutirão, em Cotia (SP), em 2002. Nas palavras de Carlos Prado, meu mestre nos caminhos do xamanismo Inca, o que houve ali foi na verdade um “reencontro”, haja vista a afinidade espiritual que se evidenciou entre nós três. Lembro-me de que, logo após a marcante cerimônia, o núcleo de nossa discussão era a profunda crise de valores por que passa a humanidade e o quanto isso aponta, paradoxalmente, para uma mudança evolutiva dos padrões da consciência coletiva, cada vez mais perceptível neste IIIº milênio, palco aberto sobre o qual estamos todos assistindo de camarote ao advento da Nova Era de Aquário.

Dali a alguns dias, Carlos Prado retornava à Bolívia. Ainda sob efeito de sua “iniciática” passagem pelo Brasil e um tanto saudoso dos mais recentes amigos feitos por conta de suas palestras e rituais em prol da paz mundial, pus-me a ler um dos livros de Gandra, Revisitando Nosso Lar (editora Abrather, 2002), no intuito de melhor conhecer suas idéias.

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Um fenômeno deu-se aí: exaurido em minhas forças após um cansativo dia de trabalho, e ao mesmo tempo mobilizado pelas fortes imagens e descrições da “cidade astral Nosso Lar”, espécie de Colônia Espiritual (conforme no-la “revelou” pela primeira vez em 1944 os espíritos de Emmanuel e André Luiz, através da psicografia de Chico Xavier), adormeci com o livro sobre o peito e tive um sonho marcante, que me inquietou sobremaneira. Não obstante, é bom que se diga, não sou filiado ao espiritismo; a propósito, Revisitando Nosso Lar, embora seja uma obra de orientação espírita, ao que me vale compreender, propõe uma quebra de vários paradigmas das crenças kardecistas, parece ser um salto quântico em relação a muitas das concepções desta doutrina que tomou a França inicialmente desde os meados do século XIX e, a partir de lá, espalhou-se por vários países e por todo o Brasil, principalmente.

As imagens de meu sonho me levaram um lugar que parecia ser uma clínica psico-espiritual situada em meio a uma paisagem bucólica, com fontes e quiosques, um lugar luminoso e florido, por onde os passantes circulavam vestidos com hábitos de cor branca. Perguntei por Tony Gandra, algo me dizia que era ali seu local de trabalho e também sua casa. Uma mulher serena me levou por entre uns labirintos de arbustos até uma enorme casa em estilo colonial, de vários andares, cujo acesso se fazia por uma escada em caracol. Subimos; eu atrás dela. Deparamo-nos no andar mais alto com um portal que, ao se abrir, revelou-me uma imensa biblioteca. Monges vestidos igualmente de branco, alguns se equilibrando em escadas que rolavam presas às prateleiras, organizavam preciosos pergaminhos nas estantes. Tony estava à sua mesa, escrevendo, e mostrou-se surpreso com minha inesperada visita. Falei-lhe que estava lendo seu livro, e que por isso encontrara o caminho até lá, ao que ele solicitou a um dos monges um manuscrito. Abriu-me o velho documento esmaecido que trazia estranhas notações arcaicas, incompreensíveis, mas que eu entendia serem de teor profético. Saímos dali pouco depois, descendo juntos por uma rampa num corredor que se estreitava quanto mais se afastava da biblioteca, ao longo do qual, em ambos os lados, havia celas monásticas. O caminho nos levava a um lindo jardim, nele algumas crianças estudavam ao ar livre, conquanto os pássaros eram seus professores e cantavam a elas seus ensinamentos. Acordei de súbito, desperto pelo telefone, cuja chamada preferi nem atender, tomado que estava pela intrigante experiência.

Curiosamente, quando procurei Gandra após haver concluído a leitura de seu livro, uma série de sincronicidades veio à tona. Assim que sentei em sua cadeira de trabalho, e conforme Tony ia cortando meu cabelo, eu lhe perguntava a respeito daquilo tudo que ele havia escrito.

Descobri então que o próprio autor não se intitulava seguidor de religião alguma. Embora tenha tido um berço cristão e mais tarde abraçado o espiritismo, Tony entende que todo aquele que se dedique verdadeiramente ao conhecimento de si próprio acaba inevitavelmente por bater às portas do Eu profundo, o que faz despertar um forte senso de religiosidade (uma função psíquica inerente à alma buscadora, segundo Jung), que pode ser tanto melhor explorado quanto menos preso a dogmas e doutrinas estiver o indivíduo. “Conforme diz o Dalai Lama, Gandra explica, cada ser humano que se expressa a si mesmo está bem consigo, e expressa sua própria religiosidade sem conflitos”, sábia receita para estarmos de bem com nós mesmos e em harmonia com o Universo, vinculados por uma religiosidade sem fronteiras, numa instância anímica em que as instituições religiosas todas se encontram superadas.

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CONCENTRAÇÃO . HARMONIA
ALEGRIA . AÇÃO CONSCIENTE
Saiba mais sobre o Religar-se

Além desta sua afinidade comigo em relação ao que pensamos acerca das religiões, sincronicidade maior foi saber que Tony mora em seu próprio local de trabalho, como o sonho sugerira. É uma Chácara – SPA chamada RELIGAR-SE, pronta para receber aos fins de semana grupos de pessoas interessadas em dar início a um processo de transformação pessoal. Para tanto, Gandra propõe um trabalho terapêutico coeso, que envolve terapia energética, relaxamento, hidroterapia, saunas, banho turco, massagens, salão para atividades e vivências tanto corporais como emocionais, incluindo a de reeducação dos sentidos, e a diferencial oferta de uma sessão de beleza VIP em seu salão particular.

Fui conhecer! Levei comigo minha filha, Maíra, na época com 5 anos. Fiquei surpreso ao ver o SPA, muito mais do que Tony se surpreendera comigo em meu sonho, afinal, os quiosques e as flores eram presentes, e a rampa pela qual descemos em sonho também estava lá. Ela corre por quase todo seu SPA, situado nas montanhas; ao lado dela distribuem-se os confortáveis chalés de hospedagem. Tony me levou, a certa altura de nossa conversa, sem que eu sequer lhe sugerisse isso, para ver seus livros e revistas, à caça que ele estava de um artigo relacionado aos críticos caminhos da humanidade, ao longo dos quais transpira cada vez mais intensamente a sensação de que estejamos no limiar da explosão de uma Nova Consciência Planetária. Tony expressou-me ainda sua percepção de ter vivido como monge em vidas pregressas, a combinar com sua maior idealização: morar num santuário dedicado à saúde e à espiritualidade, em nome do “Bem-Comum” (como ele sempre gosta de frisar), onde as almas comunguem de uma só religião universal. Spa Religar-se T. Gandra.0.5

A sincronicidade toda me atirava a uma sensação mista inexplicável de estranhamento e encantamento diante da correspondência harmônica entre sonho e realidade. Mas devo ainda dizer a curiosidade que mais me marcou: Maíra passou a maior parte do tempo se divertindo, aprendendo coisas com Seu Ozório, o papagaio, que gargalhava enquanto lhe contava lorotas e piadas! Afinal, em sua simplicidade, as crianças sabem aproveitar e aprender com a natureza à sua volta. E é certo que não somente os pássaros nos ensinam. Podemos aprender com tantos outros bichos e plantas, escutando melhor o coaxar dos sapos ou a voz da Ayahuasca, por exemplo. A natureza, em sua exuberância sem vaidades, nos ensina que melhor percebe a vida quem vive na simplicidade. É o que Tony propõe: que em nossa busca pessoal resgatemos a espontaneidade, verdadeira chave para nossa reintegração na natureza; afinal, somos também expressão dela.

A relação entre seres humanos e natureza é de tal ordem visceral que não posso deixar passar a associação que me ocorreu (talvez por força do hábito de minha profissão) ao ler pela primeira vez o termo visagismo: lembra “paisagismo”; afinal, até as árvores, as trepadeiras e a grama, vez em quando, precisam de um belo corte estético revitalizador. Tanto melhor quando feito pela tesoura certa!

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P a r a    s a b e r    m a i s
Livros de Tony Gandra:
. O Amanhecer do Grande Sol Interior; edição do autor, 1994.
. Akron, Gays e Lésbicas Além da Morte; editora Roka, 1998.
. Tony Gandra – um nome na cabeça; Personalité Editores, 2001.
. Revisitando Nosso Lar; editora Abrather; 2002.
. Dirigindo com Sabedoria; editora Abrather; 2002.
. Um Milhão de Horas – Até 120 anos Edição do autor, 2011 – com Prefácio de Paulo Urban.

In Memoriam: 
Tony Gandra nasceu em 1944 e faleceu trabalhando em 2017, aos 73 anos, enquanto cortava o cabelo de uma cliente. Ele costumava mesmo dizer que trabalharia até o último dia de sua vida. Seu infarto fulminante, tudo leva a crer, foi causado por medicação que lhe foi temerariamente prescrita, Acetato de Ciproterona, pelo médico irresponsável que dele (mal) cuidava. Uma perda irreparável. Até então, Tony Gandra, praticante de yoga e meditação, atividades estas que fazia diariamente, exemplo vivo do modelo de vida saudável que ele próprio pregava, esbanjava saúde e vitalidade. Porém, desde quando, há duas semanas, começara a tomar a referida droga, passou a sofrer toda uma série de severos efeitos colaterais, listados na bula, inclusive, sintomas estes que seu médico simplesmente menosprezou, irresponsavelmente agendando retorno de seu paciente para dali a mais de duas semanas. Lamentavelmente, o coração de Tony não resistiu até lá. Eis o que se deu. É isso.   

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