SINTAFORISMOS
por Lúcia Zenite (*)
I
Se acordaste poeta, sente teu dia.
Tudo passa, as horas sabem…
Nada fica, e as horas morrem…
Tudo é poesia quando ao tempo nada importa,
Tudo é prece enquanto o tempo impermanece.
II
Espelho dos olhos de D’us eu sou o Olho que me vê.
Através de Sua pupila sei-me húmus, sei-me seiva,
sou Sua alma mais menina à Sua imagem e semelhança;
mandala de cristais, sei-me Sua holografia,
sei-me plenafractais à Sua miragem e consonância.
III
Enquanto medito… eu me edito;
imagens sou paisagens na janela,
miragens me refratam à luz de vela…
Nua em solitude, reflito em tons de agora
toda calma e plenitude de onde
prateada e silente, brilha e mora
em sua própria maravilha,
minha Lua-espelho d’alma.
IV
Estrelas cantam ciranda toda noite sobre a Terra.
Quem as escuta, sabe e não erra:
cada uma delas um herói já redimido,
um missionário, um peregrino,
Vascos da Gama do destino
que por cruzarem o mar da vida,
singradas as chagas mais sofridas,
vencidas as lides bem sangradas,
erguidos ao celeste coro,
na cósmica amplitude sem fronteiras,
ora cantam cirandeiras melodias
a inspirar nossas porfias,
consagradas estrelas-guias.
V
Nada conhecereis lá fora que não seja antes conhecido em vós.
Por isso, sede o templo mais sagrado,
respirai sublimes bênçãos,
purificai vossos recônditos pensamentos,
serenai o coração e alcançai o santuário;
uma vez em seus jardins,
buscai pela fonte mais secreta
onde habita a centelha que, divina, vos anima, pois,
nada conhecereis lá fora que não seja antes conhecido em vós.
VI
Esta rosa que sorrindo desabrocha, escuta-a.
Esta relva que murmura, dá-lhe atenção.
Ouve ainda os rosados acordes do pessegueiro
que te acolhe em sua sombra mansa,
também o cantochão secreto das uvas,
alma deste vinho que ora bebes.
Degusta a primeva seiva que desde as raízes te penetra;
saboreia o cântico do lótus que, plácido,
desabrocha à pulsação de teu respirar
em compasso com a Grande Orquestração.
Consoante cantam as estrelas
e inda os planetas em suas órbitas,
assim é tua comunhão com a Música das Esferas.
Consoante cantam a relva, as flores, as árvores e seus frutos,
pulsa teu coração encantado ao batimento de sua ode mais perfeita.
Tudo é música no Universo.
VII
Nos meandros dos espaços interditos,
nos assombros dos maravilhamentos,
nos detalhes das sincronicidades esquecidas,
meus sentidos acusam D’us por toda parte.
Nada faço e tudo pronto se me ocorre,
sou Wu-wei-wu e nada espero,
eis-me nada em ponto zero
onde nu o amor me toca;
sou a flor que nunca morre,
o não desejo de quem ama,
o silêncio nas asas do nirvana.
Nenhum sentido me traduz mais perfeitamente
que esse meu divinumano senso de sabê-Lo assim:
conquanto Ele próprio se reconhece nos Mistérios
que habitam dentro em mim, tão somente
sem palavras me despeço dos critérios, e eis a arte:
meus sentidos acusam D’us por toda parte.
(*) Lúcia Zenite é poetisa & professora de Letras
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Também da autoria de Lúcia Zenite, no Amigo da Alma você lê também “Das Falsas Provas e do Verdadeiro Provar”.
Um deleite viajar no universo de Lúcia.
Um bálsamo pousar no cenário e percepções com que descreve.
Ainda embriagada por esse trecho:
“Nada conhecereis lá fora que não seja antes conhecido em vós.
Por isso, sede o templo mais sagrado,
respirai sublimes bênçãos,
purificai vossos recônditos pensamentos,
serenai o coração e alcançai o santuário;
… ”
Sou fã.
Andréa Camargo
Beijo imenso!
Gratidão!
Gratidão!
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