TALISMÃS
arte de Mônica Facó (*) e texto de Paulo Urban (**), publicado na Revista Planeta, edição nº372, setembro/2003
(*) Mônica Facó é artista plástica, produz em artesanato gráfico, mandalas, máscaras, talismãs e cartões. Todas as suas ilustrações neste texto (e neste site) estão protegidas por lei e não podem ser copiadas a devida autorização da artista. Contato:monicaf@solar.com.br
(**) Paulo Urban é médico psiquiatra e Psicoterapeuta do Encantamento.
Esta verdade psicológica já era sabida por nossos antepassados mais antigos. Prova disso, por exemplo, são os achados arqueológicos que mostram talismãs e amuletos, objetos estes depositários das vontades e intenções daqueles que os confeccionaram, enterrados junto aos corpos (geralmente presos junto ao peito) de homens ou animais que datam do final do neolítico.
Mas foi entre a civilização egípcia, cuja religiosidade sempre esteve atrelada à magia e à alquimia, que o uso de amuletos, feitos de diversos materiais e para variados fins, mais se difundiu na antigüidade. Num sem número de sepulturas pré-dinásticas do Egito, tais objetos, geralmente feitos em xisto verde, já são fartamente encontrados. Popularizaram-se gradativamente a partir de 3 mil a.C., ao longo da era das dinastias, quando passaram a ser esculpidos sob diversas formas de divindades, como o olho de Hórus; animais, como o abutre, o boi etc; insetos, sendo destes o mais comum o escaravelho; ou ainda sob o molde de coração, cruz ansata, cetro, colar ou outros tantos.
Não raro, tais artefatos, remotamente datados, traziam ainda inscrições com palavras de poder, obviamente talhadas por magos sacerdotes, com o intuito de que pudessem ser proferidas pelo morto em sua vida no além-túmulo. Muitas dessas imprecações, mais tarde, seriam inseridas no Livro dos Mortos, em seções especificamente destinadas a exortar o mal e provar a dignidade da alma perante o tribunal de Osíris.
Do Egito, o uso dos amuletos difundiu-se pelo mundo antigo, impressionando os persas e os hebreus que os adotaram; também os gregos, e a partir destes os romanos; e sobretudo os árabes, que os chamaram de tilasmi, que significa tanto “sortilégio” quanto “aquilo que se veste ou se porta”, de onde se originou o nome talismã.
O mestre Pitágoras, por exemplo, que se instruiu formalmente nos altos mistérios do Egito, adotou uma série de talismãs, com números e nomes gravados, com o intuito de por meio deles garantir sobretudo a saúde, e ensinava a seus discípulos em Crotona, no século V a.C., acerca do funcionamento de tais objetos, que deveriam ser confeccionados sob a devida orientação astrológica. Seguidor das idéias pitagóricas, foi o filósofo grego Apolônio de Tiana (4-97d.C.), a quem se reputa uma série de supostos milagres, quem teria melhor desenvolvido a técnica de criar talismãs denominados de “quadrados mágicos”, com números dispostos em linhas e colunas de tal forma que a soma destes, tomadas em qualquer sentido, resultasse sempre num mesmo valor.
Tal prática mais tarde influenciaria o médico alquimista Paracelso, na Basiléia do século XVI, que, além de talismãs alfa-numéricos, desenvolveu um amuleto em formato de pentagrama, a conter uma letra em cada uma de suas cinco pontas, juntas formando a palavra S-A-L-U-S (saúde, em latim), trazido por ele num colar como proteção contra a terrível peste negra.
Também entre os judeus, a ciência oculta, milenarmente guardada na cabala, não fugindo à regra, tem suas raízes no Egito faraônico. Citemos Moisés, grande iniciado na magia egípcia, que se notabilizou pelo uso preciso que fazia das “palavras de poder”, ingrediente comumente acrescido aos amuletos para que melhor concretizem o seu propósito. Lemos em Atos dos Apóstolos; 7, 22, atribuído a São Lucas que, na opinião de Santo Estevão, Moisés foi instruído em toda a ciência dos egípcios, e era poderoso em palavras e obras. Fácil constatar, em Êxodo; 7; 8-12, lemos a respeito do prodígio de Moisés, que transformou seu caduceu numa cobra diante do faraó. Este, não se fazendo de rogado, pediu a dois de seus sacerdotes, Iambres e Ianes, que imitassem tal façanha. Mas, para a surpresa de todos, a serpente de Moisés devorou as de seus adversários.
Quando da fuga do Egito, Moisés levou consigo os seus segredos e ministrou-os sob forma de Tradição Oral (a cabala) a outros escolhidos de seu povo. Convém lembrar que em hebraico, assim como o faziam os antigos gregos e romanos, os números não são escritos com cifras, senão com as mesmas letras de seu alfabeto. Com base nisso, surgiu a Gematria, sistema esotérico judaico que estabelece relações entre os nomes escritos e seus respectivos valores numéricos, de modo que as palavras passam a ter um significado oculto, somente perceptível por iniciados na arte da numerologia. Segundo esta técnica, presume-se ser possível criar nomes de poder com base no valor das letras que o compõem, nomes estes que, uma vez escritos, passam a gerar emanações secretas específicas. Tal procedimento passou a ser de fundamental importância entre os hebreus e demais iniciados na cabala, para a confecção de talismãs destinados a criar determinada condição, visto que tais artefatos poderiam ser potencializados por inscrições devidamente estudadas para tal finalidade.
Tal era a crença dos iniciados na cabala no poder das palavras, que histórias fantásticas dão conta de que o rabi Elijah de Chelm, no século XVI, com o auxílio do Sepher Yetzirah (livro sagrado cabalista, redigido entre os séculos V e VI d.C.), teria fabricado um homem artificial, o Golem, termo que literalmente significa “matéria informe”, ao qual dera vida inscrevendo em sua testa um dos nomes secretos de Deus, revelado a ele segundo a gematria. Mas a cria teria logo escapado ao controle de seu mestre, posto que não parava de crescer e se tornava hora a hora mais monstruosa. O religioso só conseguiu pôr fim a um iminente desastre apagando a inscrição do poderoso nome, com o que a criatura desfez-se totalmente.
Da gematria derivou-se o Notarikon, sistema cabalístico que considera cada palavra hebraica como um acróstico, do qual se deriva uma nova palavra de cada uma de suas letras. Talismãs famosos foram construídos por vários dos mais importantes ocultistas como Trithemius, Cornélio Agrippa e Eliphas Levi, com o precioso auxílio do notarikon. AGLA, palavra hermética muitas vezes encontrada em amuletos e outros utensílios mágicos, por exemplo, encerraria o poder da imprecação hebraica que ela guarda potencialmente em suas quatro letras: Atha Gibor Leolam Adonai, que se traduz por Senhor, Vós sois eternamente poderoso.
Todo talismã encerra duas faces: o selo e o sigilo. Entende-se por selo (ou corpo talismânico) seu aspecto externo, segundo o qual ele se apresenta a nossos olhos. Geralmente os talismãs assumem forma mandálica, ou seja, são circulares, quadrangulares, ou de formato outro que insinue a presença de um centro a partir do qual toda a figura simetricamente se organiza. Podem ainda ser esculpidos em pedra, forjados em metais, desenhados sobre o papel, feitos de gesso ou de tantos outros materiais.
Outra classe talismânica é a dos amuletos naturais, preparados por xamãs ou feiticeiros sob a forma de pequeno pacote para ser levado preso ao corpo ou nos bolsos da roupa. Costumam encerrar mesclas de matéria orgânica e inorgânica em sua composição. Podem conter em seu invólucro uma infinidade de itens devidamente escolhidos como ervas, ossos ou restos desidratados de pequenos animais, ícones de gesso, terra, sementes, pedras ou metais, sais minerais, restos de unhas ou fios de cabelo daquele que irá portá-lo, penas de aves, etc… E não nos esqueçamos dos costumes populares, que valorizam amuletos como a ferradura presa às costas da porta de entrada das casas, ou o pé de coelho, trevo de quatro folhas e dentes de javali carregados em colares e pulseiras, ou levados nos bolsos para atraírem a sorte ou espantarem o mau-olhado.
O selo pode ainda conter ou não inscrições de poder, sob a forma de palavras e números, orações ou traços cabalísticos que dizem respeito ao sigilo talismânico, isto é, a seus segredos intrínsecos. O sigilo é a alma talismânica, contraparte de seu corpo, e resume a razão ou finalidade pela qual foi confeccionado o artefato. Não necessariamente, entretanto, o sigilo deve estar gravado sob alguma forma no amuleto; ele pode simplesmente ser mantido vivo abstratamente nas intenções pessoais e genuínas de quem o preparou. Isto porque se considera que o amuleto encerre ou possua intrinsicamente uma força mágica, extensiva da vontade do indivíduo que o criou, e que se transmite àquele que irá portar o objeto, a fim de que este tenha maior proteção ou mais saúde, por exemplo.
Um dos maiores gestos de amor na magia operativa se traduz no preparo de um talismã para alguém de quem gostamos muito ou a quem desejamos nossos melhores sentimentos. Se recebemos um amuleto de um xamã, por exemplo, devemos reconhecer aí uma prova especial de sua amizade. Podemos ainda confeccionar talismãs para nossos filhos ou entes queridos, e contar com a participação deles no conjuro de tais objetos, no intuito de presenteá-los com nossas melhores intenções. Paracelso e Nostradamus, por exemplo, confeccionavam amuletos para uso de seus pacientes, e depositavam sobre eles uma intenção capaz de impressionar psicologicamente os enfermos, de modo que estes acreditassem em seus próprios tratamentos, o que de todo facilitava o caminho para a cura.
A bem da verdade, podemos dizer que não se encontra nos talismãs poder maior que o da vontade humana; eles sintetizam e representam toda uma intenção especificamente voltada para determinado efeito que se busca alcançar. Nesse sentido, os amuletos catalisam forças cósmicas e fixam o genuíno poder daquele que os possui.
Se o Universo, explica-nos a física quântica, é fruto daquilo que pensamos sobre ele, e se já é suficientemente sabido desde o século passado que o observador influi nos fenômenos que presencia, está aí a própria ciência em sua revolução chegando às conclusões que nossa arcaica mente mágica pressupunha existir ao fabricar amuletos de pedra há mais de 7 mil anos. Torna-se perfeitamente plausível a tese de que nossos pensamentos interferem no meio e criam condições mais ou menos favoráveis, consoantes com nossos padrões psíquicos conscientes ou não, que corroboram uma série de eventos entrelaçados pela fabulosa teia dos instantes sincronísticos.
A magia operativa encontra assim, no preparo talismânico, sua melhor expressão. Por meio dos amuletos ou independentemente deles todos, funciona sempre nossa vontade. Aquilo que desejamos com intensidade e justiça, não raro acabamos mesmo por realizar. Por isso cabe o aviso: são necessárias lucidez e humildade, com as quais podemos melhor discernir a boa persistência da mera teimosia, de modo que saibamos bem direcionar nossa vontade e por meio dela contribuir para o feitio do grande talismã cósmico, depositário de todos os sigilos. Seu nome? Sincronicidade. Seu maior propósito? Conspirar a nosso inteiro favor. Façamos pois (mentalizemos) as nossas preces!
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Para melhor conhecer a arte de Mônica Facó e maravilhar-se com suas inspiradoras mandalas, suas máscaras e seus talismãs, visite o site pessoal da artista: www.artedaalma.com.br
Achei este artigo excelente e esclarecedor, de maneira clara e objetiva compreendi com exatidão o que são e o porquê dos talismãs; na hora certa em que realmente necessito desta informação.
Grata,
Paz Inverencial!
Eu costumo deixar uma drusa no meu altar. Coloco medalhas talismânicas sobre a drusa para renovar energias. Daí eu pergunto: Estou agindo corretamente?
Grato pela atenção!
Fraternalmente,
Alex.’.
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